A tese de Delfim sobre o problema do café no Brasil é impressionante
Por Marcos Lisboa,
Delfim Neto foi talvez o economista da sua época mais erudito no Brasil. Conhecia a teoria e a evidência empírica.
Ele foi assistente de Alice Canabrava, historiadora econômica cuidadosa ao extremo com os dados e documentação, e aluno de Luiz de Feitas Bueno, que conhecia bem microeconomia e econometria.
Sua tese sobre o problema do café no Brasil é impressionante, combinando a melhor teoria econômica da época, com análise histórica da política do café e suas implicações.
Dela sai um tema, que é a dependência que o Brasil tinha de um bem agrícola nas suas exportações, de como isso gerava muita pressão e volatilidade para o câmbio e, de como isto afetava a economia e a indústria, em particular.
Para minimizar a volatilidade do câmbio associada ao preço de apenas um produto, ele se debruça então sobre o tema da diversificação da pauta exportadora e de por quê o Brasil só tem uma cultura importante.
Em meados dos anos 1960, ele organiza um grupo de trabalho sobre o tema da agricultura. A magistral tese de doutorado de Affonso Censo Pastore, com a análise empírica sobre como a produção agrícola reage aos preços de mercado, foi decorrente dessa agenda.
Mais tarde, ministro da Fazenda, em conjunto com o ministro da Agricultura, Cirne Lima, organiza um novo grupo de estudo, com José Pastore, Affonso Celso Pastore, Eliseu Alves e muitos outros, para estudar como superar os desafios da agricultura brasileira.
A conclusão é que faltava tecnologia para lidar com a agricultura nos trópicos. Muitas culturas foram desenvolvidas para o clima temperado, e em muitas regiões, como o Centro-Oeste, o solo era ácido e pobre em nutrientes.
Como resultado desse trabalho, surge uma das políticas setoriais mais bem-sucedidas do Brasil, que é investir na formação de pesquisadores e técnicos para melhorar solo do Centro-Oeste e adaptar culturas como a soja para o clima tropical.
A Embrapa nasceu desse esforço — foram cerca de 2 mil profissionais em 10 anos, que passaram pelas melhores universidades.
Estudos mostram que a produtividade da cresceu 3% por ano nos últimos 50 anos e que o preço da cesta básica no país caiu para algo entre 10% e 5% do que custava naquela época. Pouca gente sabe, mas Delfim teve papel fundamental nessa agenda.